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SS 24 | O melhor da Alta-Costura

25 Jan 2024
By Carolina Nunes & Maria Inês Pinto

SS 24 | Alta-Costura

Terminou ontem a semana de Alta-Costura, em Paris. Revemos algumas das apresentações mais marcantes.

O auge da Moda e do savoir-faire, representado pela Fédération de la Haute Couture et de la Mode, teve lugar esta semana, em Paris. Fendi começou a sua apresentação com vestidos de malha e trenches em pele - o que, para Alta-Costura pode parecer peculiar - mas Kim Jones rapidamente surpreendeu e apresentou modelos variados, de tecidos que pareciam flutuar pela passerelle, como, aliás, já é hábito. Robert Wun apresentou a sua segunda coleção como membro convidado da Federação e não ficou atrás das expectativas, brilhando mais uma vez pela criatividade, exuberância e perfeição técnica. Gaurav Gupta manteve o seu ADN, apresentando os já esperados vestidos esculpidos até à perfeição. Já Giambattista Valli apostou fortemente no branco, com vestidos que apresentavam silhuetas mermaid, com caudas longuíssimas ou minissaias repletas de volume. Continue a ler para descobrir alguns dos momentos favoritos da Vogue Portugal desta semana memorável.

Como já é hábito, a Schiaparelli iniciou a semana de Haute Couture como uma coleção digna de nota. Nas palavras do diretor criativo Daniel Roseberry, esta coleção foi uma homenagem a Giovanni Schiaparelli - tio de Elsa Schiaparelli - e à sua paixão pela astronomia, tendo sido ele o responsável por cunhar o termo “marciano” e, involuntariamente, estimular o fascínio que hoje temos por estas criaturas extraterrestres. Ao mesmo tempo, a coleção foi “um estudo de contradições - do legado e da vanguarda, do belo e do provocador, do que está ligado à terra e do que é enviado pelo céu” acrescenta Roseberry, mostrando como ideias que podem parecer opostas podem também combinar-se. De facto, esta era uma filosofia que já guiava a fundadora da maison, que apostava em técnicas, formas, padrões e referências que honravam o novo e o velho mundo. Além disso, todas estas referências familiares - do famoso keyhole ao fascínio pela anatomia humana - foram interligadas com códigos pessoais de Daniel Roseberry, alusivos ao Texas - o estado onde nasceu -, como as botas de cowboy ou as dezenas de fivelas que desfilaram pela passerelle, por exemplo. O resultado, nas palavras do próprio, é “uma série de perfis familiares e não familiares - parte humanos, parte outra coisa. E, portanto, totalmente Schiaparelli.”

Maggie Maurer e Daniel Roseberry
Acielle/Style Du Monde

Dior apresentou uma coleção que, para Maria Grazia Chiuri, representa uma nova oportunidade para estabelecer um diálogo entre a essência da maison e a sua evolução contemporânea. Os looks dão vida aos arquivos Dior com novos contornos - como é o caso do La Cigale, criado por Christian Dior para o outono/inverno de 1952 e reinterpretado agora numa versão escarlate e sem alças, ou o icónico vestido Miss Dior, repensado num amarelo vivo. Do veludo às trenches, a maison optou por jogar com com os códigos dos guarda-roupas diurnos e noturnos, num desfile que se ergueu num cenário repleto de significados, pela visão de Isabella Ducrot. A artista italiana tem dedicado o seu trabalho aos têxteis, sendo estes os responsáveis por inspirar o set que criou para o desfile, intitulado de Big Aura. Com 23 vestidos e cinco metros de altura, Ducrot alude à aura como uma reflexão da alma, onde as peças enormes são elevadas e endeusadas. Contrastando com o luxo dos tecidos e das peças, a artista optou por suportar a instalação num padrão de “linhas pretas sobre um fundo branco, formando uma espécie de grelha”, um tema que usa frequentemente com a intenção de “homenagear o tecido axadrezado, considerado humilde na história da moda ocidental, usado e desgastado sobretudo por trabalhadores”. O quadrado, conta Isabella Ducrot, remete para a urdidura e a trama, os dois elementos que se cruzam e que se tornam o lugar de todas as possibilidades, uma obra de arte que celebra o savoir-faire”. 

© Laura Sciacovelli

Com Haute Couture en Jeu, Giorgio Armani embarcou numa jornada de mudança e inovação. De acordo com o couturier, a expressão francesa que dá nome à coleção ganha um duplo sentido: se, por um lado, significa o próprio ato de colocar a Alta-Costura em jogo, por outro abraça a ideia de que esta coleção reflete a própria Alta-Costura a divertir-se. Aos (impressionantes) 89 anos de idade, e quase duas décadas desde a primeira coleção Armani Privé, o couturier procurou perseguir o extraordinário, correndo riscos e, nas suas próprias palavras, ser "um pouco menos Armani". Num aceno às preferências das mulheres contemporâneas, que procuram peças fora do comum, viajou do Oriente ao Ocidente e criou uma coleção de 92 looks que, apesar de não terem um tema central, revela, se guia pelo brilho e pelas cores. Os tecidos assumem sumptuosidade pelo brilho, pelos acabamentos e por um espetro de tonalidades que produz um efeito etéreo em toda a coleção.

Cortesia Georgio Armani

Imediatamente reconhecível como um código distintivo Chanel, o botão ganha um papel central nesta coleção, como já sugeria a curta-metragem The Button, divulgada pela maison, dias antes do desfile. Gabrielle Chanel tratava os botões como uma autêntica joia que ia para além da sua função e era também símbolo de emancipação. Assim, Virginie Viard procurou transportá-los para o universo do ballet e da dança, também temas importantes na Chanel: “A maison está próxima das suas instituições, dos seus coreógrafos e bailarinos, e criamos fatos para o ballet. Tentei reunir o poder e a delicadeza dos corpos e das roupas numa coleção muito etérea, composta por tule, folhos, pregas e rendas", explica. A convite da diretora criativa, Kendrick Lamar, Dave Free e Mike Carson conceberam um cenário que remete para os símbolos da Alta-Costura, tal como em The Button. Num ano que assinala a longevidade dos laços entre a Chanel e a dança - um século após as primeiras criações de Mademoiselle Chanel para o ballet, as Artes voltam a unir-se para contar histórias e evocar emoções.

Cortesia de Chanel

Simone Rocha foi convidada a desenhar a coleção de Haute Couture de Jean Paul Gaultier e o resultado final foi o equilíbrio perfeito entre as estéticas e identidades de ambos. A narrativa consistiu em pegar nas ideias da técnica da Alta-Costura, olhando para o espírito de Gaultier, e trazer todos os elementos à luz através dos seus próprios códigos, explica a criadora irlandesa (e diretora criativa da marca epónima). Das fitas estilo atacador que lembravam os icónicos corpetes do Enfant Terrible da Moda, às copas em cone com um twist (assemelhando-se agora ao espinho de uma rosa) e dos chapéus de marinheiro às próprias marinière: a designer criou uma coleção que respira e celebra a feminilidade, conferindo-lhe o seu habitual tom romântico, contrabalançado com a ousadia de Gaultier: "Foi o domínio, a feminilidade, a sexualidade, a sensualidade, sendo muito provocadora. Há uma provocação lúdica em Gaultier que eu queria realmente trazer”, explica. Entre aplausos e elogios, o desfile culminou num sentido abraço entre os criadores.

Simone Rocha
Launchmetrics Spotlight

A apresentação de Viktor&Rolf é das mais aguardadas em todas as semanas de Alta-Costura, já que a dupla de criadores prima pela originalidade e pela irreverência. Desta vez, com Scissorhands, os criativos desvendaram uma coleção baseada em antagonismos, com o “polidos versus cru”, “pensado versus improvisado” e “sério versus divertido”. Foram apresentadas 28 silhuetas totalmente pretas em sete grupos de quatro, onde o primeiro look de cada grupo serviu de ponto de partida para as três iterações seguintes do mesmo design, onde cada um refletia acerca das possibilidades e impossibilidade criativas trazidas pela tesoura. De pequenos buracos a vestidos cortados ao meio, Viktor&Rolf procuram “controlar o caos através de um acabamento manual meticuloso de cada corte, corte e buraco”, num desfile onde o paradoxo foi o tema central, com a perfeição técnica da Haute Couture a contrastar com a “espontaneidade crua e experimental dos designs cortados à tesoura”.

Cortesia de Viktor&Rolf

O Salão ganha uma importância central na mais recente coleção de Valentino, representando “um regresso e uma partida”, simultaneamente uma homenagem à herança da Alta-Costura e uma nova proposta, adaptada aos valores e necessidades contemporâneas, esclarece Pierpaolo Piccioli, diretor criativo. Em Le Salon, as propostas da casa de moda italiana regressam à intenção original da Haute Couture, a sua génese, numa “procura obsessiva da perfeição, aliada a uma paixão pela mão, um fascínio pelo processo”. Em tempos dominados pelo artificial, Valentino apresenta-nos o real nos salões Place Vendôme, que agem não só como um palco mas como um meio cultural de valorização das artes. Nas palavras da marca, “a contradição é inerente à Alta Costura - a simplicidade é complexa, a espontaneidade é o resultado de um gesto cuidadosamente ponderado” e, para isso, as justaposição de elementos é feita de forma instintiva ou inesperada, despertando emoções, numa apresentação que faz “colidir pragmatismo e fantasia, volumes diferentes, sensações abstratas”, que ressaltam a verdadeira essência da Alta-Costura.

Valentino/SGPItalia

Maison Margiela encerrou a semana de Haute Couture ao comando de John Galliano, que mostrou uma vez mais o porquê de ser um dos nomes mais sonantes da indústria. O desfile foi apresentado ao lado do Sena, na primeira lua cheia do ano, num bar que parecia não ter sido limpo ou arrumado, após a noite anterior. A apresentação da coleção Artisanal da maison começou com uma atuação do artista Lucky Love, seguida de um momento cinematográfico “impregnado do ambiente sinistro e chuvoso de Paris à noite”. Galliano deu destaque às silhuetas, com cinturas esculpidas com corpetes apertadíssimos, e enchimento nas ancas, criando autênticas figuras hourglass. São de destacar os tecidos transparentes, que evocam sex appeal e as peças aparentemente inacabadas, muito ao estilo Margiela. Os sapatos foram criados com Christian Louboutin, e a maquilhagem de Pat McGrath e cabelos de Duffy transformaram as modelos (ainda mais) em autênticas bonecas, conferindo dramatismo. Lembrando os tempos de Galliano na Maison Christian Dior, esta apresentação ficará, certamente, marcada na história.

Lucky Love
Maison Margiela

Carolina Nunes & Maria Inês Pinto By Carolina Nunes & Maria Inês Pinto

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